segunda-feira, 30 de maio de 2011

Hora do espanto

Um leitor pelo Formspring perguntou-me a origem da palavra "espanto".

Antenor Nascentes refere-se ao verbo *expaentare (latim vulgar), com base em expavere ("ter muito medo", "assustar-se"). Há um outro verbo latino implícito, pavere ("tremer de medo", "estar possuído de pavor").

Criação do publicitário
e ilustrador Silmar Ribeiro
O espantalho é aquele que apavora. Sua função: gerar medo nas aves predadoras. O boneco representa o homem que afugenta e espanta o indesejável.

sábado, 28 de maio de 2011

— Uai!

Carmen Souza Ennes, leitora deste blog, pergunta qual a origem da palavra "uai".

Essa interjeição, marca registrada do falar em Minas Gerais, é muito rica. Exprime admiração, impaciência, surpresa, pasmo, susto e até terror. Pode ser usada também para reforçar mensagem, manifestando estranhamento com a dúvida do outro: "Eu já não disse que está tudo bem, uai!"

Há pelo menos duas explicações fantasiosas.

Uma delas atribui aos Inconfidentes Mineiros a sigla UAI ("União, Amor e Independência"), senha do grupo. Com o tempo a expressão teria se disseminado sem referência ao episódio histórico.

Outra explicação, falsa mas inspiradora, associa a interjeição ao inglês why. Os mineiros teriam adotado e incorporado a palavra do inglês, ampliando-lhe o sentido.
O mais provável, porém, é que "uai" remeta à interjeição latina vae ("ai!", "ah!"), como em "vae victis", "ai dos vencidos!".

sábado, 21 de maio de 2011

Impostos e imposturas

Recentemente, meu amigo Elie perguntou-me se "imposto" e "impostor" têm a mesma raiz.

Elie, não posso lhe sonegar essa resposta! Carlos Drummond de Andrade, recorrendo a uma brincadeira tautológica, dizia que o imposto se chama imposto porque é imposto...

De fato, existe um parentesco entre as duas palavras. O pai de ambos é o verbo latino imponere, "impor". No caso dos impostos, são cobrados como algo obrigatório e quem os cobra exerce uma força sobre nós. E quanto ao impostor, é aquele que engana, impondo uma mentira como se verdade fosse.
Se um Estado não utiliza os impostos corretamente, comete uma impostura. E é compreensível que os contribuintes se sintam ludibriados.

segunda-feira, 16 de maio de 2011

Autópsia etimológica

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Está nas bancas um novo número especial da Revista Língua Portuguesa sobre o instigante e interminável tema da etimologia. Participo desta edição com dois artigos. Um deles se detém na história de palavras ligadas à vida familiar: "pai", "mãe", "marido", "esposa", "irmão", "avô"...

O outro é sobre a origem de palavras relacionadas ao corpo humano: "dedo", "nariz", "pescoço", ombro", "joelho", "pé", "tornozelo"...

Uma verdadeira autópsia etimológica. E o competente editor, Edgard Murano, orientou a diagramação bacana, distribuindo ao lado de um corpo humano as palavras e suas origens.

Na mesma edição, artigos excelentes de Jean Lauand, Mário Eduardo Viaro, Luiz Costa Pereira Jr. e Deonísio da Silva.

sábado, 7 de maio de 2011

— Ché!

Meu amigo, o ilustre professor João Paulo de Oliveira, lançou-me um desafio etimológico:

"Caríssimo amigo Prof. Gabriel Perissé, bom dia! Solicito seus valiosos préstimos no sentido de esclarecer a origem da palavra 'ché'. Será que está vinculada à expressão regionalista meridional 'tché'? Eu a utilizo quando quero expressar ironia ou desejo deixar patente que pode haver outros sentidos para o que escrevi... Está correto? Antecipadamente agradeço!"

Meu prezado João Paulo, essa interjeição expressa dúvida, surpresa, mofa, zombaria. Tem a ver com a interjeição "chê", com o "ê" fechado, típica da fala do sulista brasileiro, com duas funções básicas: chamar alguém ou indicar admiração, assombro.

O "chê" (pronuncia-se "tchê"), segundo o etimólogo J. Corominas, provém do antigo castelhano ce, que seria, por sua vez, derivação de uma possível forma onomatopaica "tsss", ou "sss", com o intuito de chamar a atenção de alguém ou chamar animais.

Não é a única hipótese. Uma outra sugere que viria do te (latim, acusativo de tu), passando pelo galaico. Há quem afirme, como o linguista uruguaio José Pedro Roma, que viria do guarani che, "meu", em chamamentos como che amigo, che coronel, che Juanche Guevara...

domingo, 1 de maio de 2011

A etimologia veio trabalhar

No Dia do Trabalhador (outros preferem Dia do Trabalho), a etimologia acordou cedo e, mesmo sendo feriado, e feriado num domingo, veio trabalhar.

Veio trabalhar com gosto, lembrando que já estão superados os dias do verbo *tripaliare, do latim vulgar, com o sentido de "torturar", "fazer sofrer". Esse verbo, por sua vez, procede de tripalium, instrumento romano de tortura empregado contra quem não cumpria seus deveres. Que instrumento era esse?

Tripalium remete provavelmente ao adjetivo tripalis: "sustentado por três (tria) estacas (palus, 'estaca')". O supliciado era atado a esse tripé. Na realidade, quem trabalhava mesmo era o torturador, e não a vítima. A ele cabia o trabalho sujo. O que nos faz pensar em alguns chefes que sofrem ao cumprirem sua amarga missão...